Processo Nº 583.50.2003.065972-5
Texto integral da Sentença
PODER JUDICIÁRIO SÃO PAULO 18ª VARA CRIMINAL CENTRAL DA
COMARCA DE SÃO PAULO PROC. N. 164/06 Vistos etc. WILLIAM TIMOTEO DA SILVA,
qualificado nos autos, está sendo processado porque, conforme narra a denúncia,
entre os dias 2 de janeiro e 31 de julho de 2003, na rua Porto de Palos, n. 1,
Pirituba, neste município e Comarca, com intuito de lucro por meio de
mercancia, vendeu discos compactos com cópias de peças fonográficas
reproduzidos com violação de direito autoral. Consta que o réu obteve cópias de
todas as musicas comercializadas pelo antigo grupo musical The Beatles e, como
possuía acesso cadastrado a internet, elaborou página virtual em que passou a
oferecer, para aquisição, a Coleção Completa dos Beatles em MP3, primeiro por
dez reais e após por vinte reais, mediante depósito no Banco Itaú, em conta de
sua titularidade. No período acima descrito, registraram-se cento e quarenta
pedidos, produzindo e entregando aos compradores igual número de cópias
fonográficas. Citado, foi o réu interrogado a fls. 202/203, com defesa prévia a
fls. 211/213. Na instrução foram ouvidas duas testemunhas arroladas na denúncia
e sete arroladas pela Defesa. Em razões finais, pugnaram o Ministério Público e
a Assistência da Acusação pela condenação do réu, nos termos da denúncia,
enquanto a Defesa pediu a absolvição, anotando ainda a ausência de dolo, ou a
desclassificação para o delito de violação de direito autoral sem intuito de
lucro, com a declaração da prescrição. É o relatório. Decido. A ação penal
transcorreu sem máculas processuais, estando o feito em termos para a sentença.
A materialidade dos delitos restou bem comprovada pelos documentos de fls. 3 e
seguintes (notícia do crime pela Associação Protetora dos Direitos Intelectuais
Fonográficos do Brasil), envelope cujo remetente é o réu, contendo disco
compacto com discografia completa do grupo The Beatles, de 1963 a 1970,
perfazendo dezesseis álbuns e 295 faixas (fls. 18/19), documento de fls. 20 e
seguintes (mensagens eletrônicas em nome do PROC. N. 164/06 FLS. 2 réu,
informando preços e dados bancários para aquisição dos fonogramas), laudo
pericial de fls. 129 e seguintes (acerca de dados eletrônicos por meio da
internet, relativas ao endereço eletrônico usado pelo réu para o comércio dos
fonogramas), além de extratos do Banco Itaú, a fls. 169 e seguintes, em que
constam depósitos noticiados como advindos dos ilícitos penais. A autoria do
delito está também demonstrada, recaindo sobre o ora imputado. O réu, em seu
interrogatório judicial, negou os delitos. Disse que compilava as musicas do
citado grupo musical, sendo por ele aficionado, e procurou organizar fã-clube,
entregando para amigos, gratuitamente, alguns discos compactos com a obra do
grupo. Anotou que os valores eventualmente recebidos pagavam “custos de mídia”
e de remessa do produto. Na fase policial, entretanto, confessou os crimes,
dizendo que tinha página virtual na internet, na qual fazia propaganda do
fonograma que era colocado no comércio, tendo vendido cerca de duzentas
unidades. A negativa parcial do réu, em juízo, está ilhada do conjunto
probatório. Solange, a fls. 222, disse que a polícia foi acionada por
associação cujo escopo é o resguardo de direitos autorais. Anotou que o réu
dizia que queria formar fã-clube e não obter lucro com os fonogramas.
Wanderley, a fls. 223, anotou que o réu reproduzia as cópias dos fonogramas,
não sabendo se com o escopo de lucro. Disse crer que não objetivava ele
cabedais ilícitos. Das testemunhas arroladas pela defesa, Vitor soube que o réu
apenas tinha banda “cover” dos Beatles e site relacionado com um fã-clube do
grupo. O mesmo disseram Jane, a fls. 228, Vinicius, a fls. 229, e Bruno, a fls.
268, sendo que os dois primeiros ainda anotaram terem ganho do réu discos
compactos contendo músicas do citado grupo. Magali, a fls. 251, aduziu que o
réu lhe deu um desses discos, não sendo ele original, eis que o acusado o
copiou em máquina. Reginaldo, a fls. 289, soube que o imputado presenteava
constantemente as pessoas com discos compactos do grupo musical em comento, não
sabendo de comercialização. O mesmo disse Sandro, a fls. 315, asseverando,
entretanto, que o réu cobrava pelas despesas de postagem dos fonogramas. A
prova colhida é, pois, claríssima no tocante à violação de direito autoral. O
réu copiava sem autorização e disseminava ao público fonogramas da banda
musical em tela. Resta evidente, também, e isso anota a prova pericial, assim
como a fartíssima prova documental, que o acusado tinha o intuito de lucro e
efetivamente lucrou com as verdadeiras transações comerciais havidas. De se
notar que no site em que PROC. N. 164/06 FLS. 3 propagandeava a venda (e não a
mera remessa por espírito de aficionado) dos fonogramas, em momento algum havia
anotação de que se tratava de fã-clube ou de que as transações seriam
efetivadas apenas com amigos ou outros aficionados pelo citado grupo. Ademais,
indica-se que o valor fixado para o negócio referia-se à própria venda do disco
compacto, e não apenas às despesas postais, tanto assim que há mensagens
envidadas pelo acusado, como ocorre a fls. 22/23, em que, após indicar o valor
da transação comercial, anotava-se que a tarifa de correio já estava incluída
no preço, além de haver pura propaganda do negócio, ao público em geral,
lembrando que a oportunidade de compra era única, eis que se poderia adquirir a
baixo custo a coleção integral, ao passo que um disco simples (original, é
evidente) teria custo bem maior. O laudo pericial nos dados eletrônicos
relativos ao réu e os inúmeros depósitos em sua conta corrente reforçam a
certeza de violação de direito autoral com intuito de lucro. Inviável a
desclassificação para a forma simples do delito, portanto. Não há, ademais,
prescrição a ser declarada. É patente, ainda, a presença do dolo. O imputado
sabia ou deveria saber que a venda desses produtos contrafeitos é pratica
criminosa. A propaganda oficial é firme e notória no sentido de buscar coibir
essa deletéria prática, ademais. Com várias ações (ao que consta, mais de um
centena delas) o réu praticou vários delitos idênticos que, pela similaridade
de tempo, espaço e modo de operação, devem os subseqüentes serem tidos como
continuação do primeiro, daí porque a presença do instituto da continuidade
delitiva. A exasperação de pena, em razão da grande quantidade de infrações,
deve ser posta no máximo de lei. A denúncia é, portanto, procedente. Na fixação
da pena, atento ao que dispõe o artigo 59 do Código Penal, por ser a conduta de
gravidade moderada para a espécie, deve a sanção (do tempo dos fatos, mais
benéfica ao acusado) ser fixada no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão e 10
(dez) dias-multa no valor unitário de um quarto do salário mínimo, em razão da
natureza do delito, do prejuízo causado pela violação do direito, além da noticiada
capacidade econômica do réu, algo maior do que o diuturnamente encontrado nas
ações penais, contanto ele com curso superior e defesa constituída. O mínimo
legal é ratificado pela atenuante genérica da confissão espontânea, ainda que
parcial. PROC. N. 164/06 FLS. 4 A sanção é exasperada, pela continuidade
delitiva, conforme já fundamentado, de 2/3 (dois terços), perfazendo sanção
final de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa.
Ante o exposto e o que mais consta dos autos, Julgo PROCEDENTE a denúncia para
CONDENAR, como CONDENO, o réu WILLIAN TIMOTEO DA SILVA, qualificado nos autos,
dando-o como incurso no artigo 184, § 2º, por cento em quarenta vezes, na forma
do art. 71, ambos do Código Penal, a cumprir a pena de 1 (um) ano e 8 (oito)
meses de reclusão e 16 (dez) dias-multa no valor unitário de um quarto do
salário mínimo. Sendo primário e não havendo notícia de antecedente criminal
qualquer, poderá recorrer em liberdade e iniciará cumprimento de pena em regime
aberto. Por fazer jus subjetivamente e estarem presentes os requisitos
objetivos da lei, mostrando-se a substituição suficiente no caso presente,
SUBSTITUO a pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos,
consubstanciada na prestação de serviços à comunidade, a critério do MM. Juízo
das Execuções Criminais, nos termos dos artigos 44 e 46, do Código Penal.
Lance-se o nome do réu no rol dos culpados, após o trânsito em julgado. Custas
pelo réu, no mínimo de lei (conta com defesa constituída). Publique-se, registre-se,
intimem-se e comunique-se. São Paulo, 13 de fevereiro de 2008 MARCELLO OVIDIO
LOPES GUIMARÃES JUIZ DE DIREITO