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Perguntas argumentativas…

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Manuel Atienza, nas aulas de seu Curso de Teoria da Argumentação em Alicante, assevera que o interrogatório é uma forma de argumentação. E com efeito, ao se realizar um bom interrogatório se estará, muitas vezes, demonstrando ao julgador acerca da pertinência de sua tese e, em muitas outras, demonstrando, inclusive ao próprio depoente, o absurdo das informações que traz.

Por isso mesmo a audiência trabalhista é tão importante para a solução do litígio. Infelizmente ainda assim esta solenidade costuma ser negligenciada por uma grande parte de grandes escritórios que designam para realizá-la advogados iniciantes, deixando para os mais experientes o comparecimento ao Tribunal para sustentação oral. Via de regra quando o processo já se encontra irremediavelmente perdido, inclusive por uma instrução mal feita.

Em uma ocasião a prova que se pretendia produzir era em relação à insalubridade decorrente da exposição ao cimento. A demandada era uma empresa de construção e a conclusão do laudo pericial indicava que as atividades eram insalubres pelo manuseio com cimento.

A insalubridade no Direito do Trabalho depende do enquadramento dos produtos insalubres em relações emitidas pelo Ministério do Trabalho. Assim é no Anexo 13 da NR 15 que se encontra a previsão acerca da existência de insalubridade em grau mínimo para a atividade de fabricação e transporte de cal e cimento nas fases de grande exposição a cimento.

O laudo, no entanto, não descrevia que ocorresse a fabricação ou transporte de cimento. A conclusão decorria, simplesmente, de seu entendimento (respeitável, aliás, e ao qual por muito tempo já me filiei) de que a mera exposição do trabalhador ao trabalho com cimento lhe asseguraria o direito ao referido acréscimo em grau médio.

Nada obstante o advogado da demandada, com o intuito de ampliar ainda mais a sua demonstração, apresentou a uma das testemunhas o questionamento acerca de o trabalhador prestar serviços de fabricação de cimento.

Ora o questionamento tinha uma finalidade específica e, de fato, para o convencimento do Juízo era um bom argumento. Tinha, com certeza, a finalidade de alertar ao julgador, caso ele ainda não houvesse percebido, que as normas regulamentadoras não indicavam a insalubridade pelo contato com cimento, exceto no caso de fabricação.

Por outro lado, contudo, esta matéria não era sequer controvertida. Ou seja nem o perito, nem qualquer das partes (autor ou réu) alegavam que havia o trabalho nesta atividade – de fabricação de cimento. Ou seja, nada obstante fosse útil como método de argumentação, se encontrava fora da matéria objeto de prova.

Considerando-se, portanto, que a prova é feita para o julgador, o argumento estava lançado e restava esperar que o juiz o assimilasse ao formular seu julgamento. No entanto não era pertinente que fosse efetuado o questionamento ou que este fosse registrado. Mesmo porque, se não fosse acolhido pelo julgador, poderia ser demonstrado novamente a instância recursal, uma vez que era matéria não controvertida e, portanto, não sujeita a prova.

Entender-se em sentido contrário, abriria espaço para se apresentar toda e qualquer questão estapafúrdia não controvertida nem atinente à prova dos autos.

Nada obstante o advogado acabou por manter o questionamento e, ao ser indeferido, com a explanação acerca deste indeferimento, reiterou, o que levou a aplicação da pena de litigância de má-fé, com fundamento no art. 14, III, do CPC.

A imagem que ilustra este artigo é o clássico Testemunha de Acusação, de Billy Wilder, que pode ser encontrado na Livraria Cultura.

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