Este post é apenas para responder, com mais espaço, uma pergunta que o usuário do Twitter, @lycurgo me fez. A questão diz respeito à reeleição e se iniciou quando eu afirmei no meu Twitter:
Na ocasião eu me referia à notícia de que a Suprema Corte Colombiana havia barrado, em decisão final, a intenção do seu presidente Álvaro Uribe de concorrer a um terceiro mandato.
Lycurgo, acrescenta:
Em verdade não tenho nada contra que exista uma, duas, três ou infinitas reeleições. No entanto tenho tudo contra a que as regras do jogo sejam mudadas no seu meio. Ou seja o Sr. FHC, assim como o Hugo Chávez, fizeram exatamente isso. Meteram goela abaixo da população emendas constitucionais para assegurar que eles próprios pudessem permanecer no poder.
Ou seja entraram em um jogo e, quando este estava para acabar para eles, alteraram sua regra, se beneficiando de imediato da alteração. Isso me parece antidemocrático.
Foi também isso que tentaram fazer Manoel Zelaya, que teve sua tentativa frustrada em decorrência não de um golpe, mas de uma cláusula pétrea na Constituição Hondurenha que já previa que isso poderia acontecer e que, por antecipação, previu, inclusive, a pena de prisão em tal caso. Igualmente foi esta a tentativa de Uribe que, por seu turno, foi impedida pela Corte Constitucional de seu país.
Inicialmente eu era contra a reeleição. No entanto depois de refletir um pouco mais, passou a me parecer que um mandato de apenas 4 anos talvez seja, de fato, muito pouco para se administrar um país. A alternativa seria, eventualmente, um mandato maior, de seis anos, por exemplo, o que me parecia, por seu turno, muito longo, no caso de o eleito frustrar as expectativas de seus eleitores.
Neste quadro um mandato de quatro anos, com a permissão de uma reeleição, me parece um pouco mais palatável. Seria algo do tipo um mandato de oito com um plebiscito no meio. Ou seja se o governante fosse muito ruim seu mandato terminaria no meio. Se estivesse razoável teria mais quatro anos.
De outra parte podemos citar pelo menos uma grande nação em que isso funciona, os EUA. Se tentamos copiar tanta coisa deles, o regime de eleições para o Executivo não me parece o mal maior.
Olá Jorge,
Agradeço-lhe imensamente pelo trabalho em responder a minha pergunta. Entendi o seu argumento. Para você, o que não pode é mudar as regras no meio do jogo (com o que concordo), o que, conforme disse, ocorreu tanto com Chaves quanto com FHC (com o que não concordo).
Assim, o argumento da inconstitucionalidade por afronta à democracia não diria mais respeito ao número de reeleições, mas sim se ao questionamento de se mudança é feita no curso do mandato do Chefe do Executivo, que eventualmente poderá se beneficiar com as mudanças.
Do meu ponto de vista, é um entendimento respeitável, mesmo que possa sofrer algumas críticas. E a crítica central se baseia exatamente na constatação, por todos nós sabida, de que quem emenda a Constituição não é o Executivo, mas o Legislativo. Vejamos.
Sabe-se que quem emenda a constituição é, em última instância, o Legislativo, mesmo que a iniciativa possa ser, naturalmente, do Presidente da República. Mas isso não é tão simples assim, não é mesmo? Da perspectiva sociológica (ou política, se prefere), dizer quem emenda a constituição não quer dizer muito, pois sabemos que o Executivo exerce poder imenso sobre o Legislativo no Brasil, mormente quando dispõe de uma base aliada tão ampla.
O problema, contudo, é que o argumento acima (o da influência eventualmente indevida do Executivo no Legislativo), embora pareça verdadeiro, não é estritamente jurídico e, assim, é difícil saber como poderia ensejar uma inconstitucionalidade de uma emenda constitucional devidamente votada nos termos previstos na própria constituição.
Creio que, caso isso viesse a ser ventilado no Brasil, os juízes do STF, caso entendessem pela inconstitucionalidade, teriam de se deter à questão do número de mandatos mesmo… Não sei exatamente como, mas seria, por certo, um argumento fraco juridicamente para encobrir um problema da estrutura política (da sociologia da política).
Um ponto interessante a ser observado é que uma reeleição é um instituto ontologicamente diverso de duas ou mais, pois com uma reeleição (como é o caso do Brasil desde FHC). Na reeleição única, o instituto só poderia ser usado uma vez; nas reeleições múltiplas, ele poderia ser usado um sem-número de vezes, o que, por certo, feriria de morte a nossa democracia.
Enfim, creio que concordo com o ponto a que você chega na sua resposta, mas respeitosamente divirjo do caminho traçado, o que não gera efeitos apenas abstratos, pois, conforme exposto no meu ponto de vista, FHC teria agido democraticamente, enquanto Chaves não.
Agradecendo mais uma vez a sua atenção, aqui encerro essas breves linhas.
Lycurgo
@Tassos Lycurgo,
Agradeço pelo comentário.
Não falei em inconstitucionalidade em caso algum. Para mim a situação diz mais respeito à legitimidade (em sentido figurado e não de ilegalidade).
Ou seja a questão é estritamente política. Tanto no que diz respeito à aprovação da emenda da reeleição, e seria igualmente político um julgamento na Suprema Corte em relação a este fato, independentemente de ser constitucional ou não sob o ponto de vista formal.
Ao fim políticos são políticos e tendem a agir desta forma, mais ou menos como a fábula do escorpião e do sapo. Tanto que muitas das medidas do governo atual se demonstrar diametralmente opostos aos seus discursos de antes do poder, sem que isso sequer os deixe corados.
Grande abraço!