A aprovação do Projeto de Lei 36/2006 pelo Senado, estabelecendo uma certa inviolabilidade dos escritórios de advocacia deve ser muito bem analisada. Acontece que ao se levar ao extremo a sua interpretação se estará viabilizando que os locais de serviço de advogados se tornem asilo para criminosos e depósitos de mercadorias ilegais.
Não é o que se pretende. Todavia existe em nosso país uma incorreta apreensão dos direitos e deveres dos advogados, na medida em que estes se tornam cúmplices de seus clientes. Em verdade o advogado deveria conduzir um processo de forma a demonstrar o direito de seu cliente na forma mais ampla. Entretanto quando o cliente é réu e culpado a atividade do procurador deveria ser a de reduzir a pena ou minimizar as conseqüências de sua provável condenação.
Admitir-se que o advogado, consciente dos ilícitos praticados por seu cliente os negue o torna tão culpado quanto ele. Esta minha opinião é notoriamente minoritária, mas deve ser avaliada, senão sob o ponto-de-vista da pertinência da lei referida, pelo menos pelo aspecto da Ética.
Aliás a Associação dos Juízes Federais já se manifestou quanto à sua intenção de questionar a constitucionalidade da lei caso ela seja sancionada pelo presidente, único passo que falta para a sua vigência.
Vou transcrever o comentário que fiz essa semana sobre o tema lá no blog do Nassif:
“Esse projeto é inconstitucional. É que vige em nosso ordenamento jurídico o princípio da inafastabilidade da jurisdição, consagrado no art. 5º, XXXV, da Constituição: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
No caso, é preciso ter em mente que a defesa de grande parte dos direitos da coletividade não cabe ao cidadão, mas ao Estado. É a chamada “vedação à autotutela”, fundamento do Estado Democrático de Direito. Assim, ao agir por meio da polícia ou do MP, o Estado está tão-somente reprimindo lesões (ainda que não-consumadas) a direitos de toda a coletividade, mediante o uso de uma atribuição exclusivamente dele, Estado.
Logo, não pode a lei ordinária excluir, nem por via oblíqua, a atuação legítima do Estado no combate a infrações que possam estar sendo cometidas (no caso, crimes) pois isso significaria, na hipótese de não se devolver aos indivíduos a possibilidade da autotutela (o que seria trágico), a criação de zonas de vazio da Lei, o que é incompatível com qualquer ordenamento jurídico. Este deve ser visto como uma função contínua, cabendo para cada hipótese fática uma solução jurídica, sendo descabida a pretensão de criar-se vácuos.
Ademais, há o chamado “poder geral de cautela” do juiz, há muito consagrado, e que, em última análise, pode ser evocado para fundamentar qualquer decisão judicial, exatamente objetivando garantir o respeito aos valores constitucionais.
Por isso, penso que, felizmente, essa lei não vingar.”
Abs!